09 maio 2016

Consciência corporal

Mais uma vez estou a ser desafiada na fisioterapia para ter mais representação corporal. É mais um lance de escadas que estou a subir para chegar ao topo do arranha-céus que pretendo passear em seu imenso terraço amplo e ter uma vista maravilhosa, contemplar uma vista com enormes jardins, com enormes campos abertos repletos de flores com todas as cores do arco-íris. Quem sabe, poderei achar a verdadeira direção e traçar também o sentido para a minha reabilitação, porque eu acredito mesmo nela, sem dúvidas nenhumas. Enquanto eu acreditar, e quem está comigo nesta longa estrada também acreditar, tiver recursos monetários, saúde e amor, eu acho que tudo é possível, escrevo isto porque já venci tantas batalhas, que acho que era uma pena após tantas conquistas morrer na praia, e por isto enquanto depender só de mim não desistirei nunca, porque faz parte da minha essência.

Estou aqui com esta conversa toda, afastando-me do tema inicial que me propus relatar, que é acerca da consciência corporal e como a tenho alcançado.

Anteriormente falei acerca da representação do corpo no cérebro e como esta representação é imprescindível e necessária para haver qualquer movimento dos músculos, não basta sentir e ter força, os mesmos têm de ser comandados pelo chefinho, este é que comanda tudo, os movimentos, as ações e reações, as nossas emoções, a nossa postura para enfrentar as adversidades e também nos momentos de tristeza e nos momentos de felicidade. Esta é uma máquina tão perfeita e tão capaz de reagir e interagir com as situações do dia-a-dia, atuando de modo diferente para cada indivíduo, enfim afinal de contas somos todos iguais mas todos diferentes, sobretudo no campo emocional.

Agora vou relatar o trabalho que realizo diariamente na fisioterapia, este é apenas um dos trabalhos que fazemos. No ginásio cujo chão está coberto de colchões, dispostos ao longo da sala de forma simétrica, eu encontro-me com uma venda nos olhos e de joelhos ou em pé tenho que me dirigir aos vários obstáculos que são colocados na sala, conforme o meu fisioterapeuta me pede. Tenho que ter noção do local da sala onde me encontro e memorizar o trajeto.

A sala tem cinco paredes, duas portas e uma enorme janela, um step, uma cadeira, um saco de boxe fixo ao chão e por vezes o terapeuta coloca uma corda e uns pinos no chão para ter referências, uma vez que estou com os olhos tapados, este exercício é bastante complicado para mim e no início cheguei a desesperar, atualmente já não é tanto assim, com a repetição tornou-se mais fácil, até o terapeuta começar a complicar os percursos, é um trabalho muito importante e necessário.

Este trabalho é deveras muito importante, uma vez que tenho os olhos vendados, permite que os outros sentidos fiquem mais atentos e a concentração aumenta bastante, mas é um mal necessário e o esforço é tanto que quase sempre fico atordoada ao fim de algum tempo.

No início desta atividade, há algum tempo, os terapeutas colocavam-me a venda nos olhos e eu perdia-me quase imediatamente na sala, perdendo a noção onde estava, se estava a andar de gatas para a esquerda ou para a direita. A minha perceção era que andava constantemente às voltas a deslocar-me para a esquerda, não conseguia andar em linha reta, não tinha a noção do lado direito, era como se esta parte do meu corpo não existisse apesar de eu ter a sensibilidade normal. A minha consciência do meu corpo foi aumentando com as atividades pedidas, de tal modo que fui tendo uma maior representação cerebral do meu corpo e uma melhor noção dos meus movimentos. Assim, a minha cabeça fez reset e agora tem de ser reprogramada desde o inicio, aprender todos os movimentos com a repetição do movimento, de modo não inato. Isto é, as células do cérebro destinadas ao movimento morreram, estas não se regeneram como por exemplo um osso partido que ao fim de umas semanas está firme, nas lesões cerebrais isto não acontece, estas quando morrem, morrem mesmo. O que acontece é que o nosso cérebro tem plasticidade suficiente para as células que estão ao lado daquelas que faziam o movimento, quando são estimuladas com movimento, ao fim de um tempo, também aprendem o movimento, é como uma colagem de retalhos nada fácil, em que cada retalho tem de ser devidamente remendado e é preciso muita paciência.


Bem, acho que já estou a ser chata com esta conversa toda, mas é um facto assente, vivo as minhas dificuldades diariamente e encaro-as como fazendo parte de mim, continuando a vencer todos os dias pequenas conquistas, tentando dar um sentido a esta passagem pela vida do modo que sei e tentando sempre dar o melhor de mim, espalhando e colocando uma energia otimista, com esperança e semeando o melhor que existe na minha pessoa. Apesar de a minha vida ter dado um volta de 180o, estou de bem com a vida, aceito e tenho a certeza que vou sempre subir os degraus do arranha-céus e desfrutar de uma vista repleta de flores de todas as cores do arco-íris ao longo desta vida e espalhando sempre amor por aqueles que estão comigo e também que não estão nesta caminhada que me foi imposta pela vida.

Patrícia Arsérnio